Tribunais dão decisões conflitantes sobre candidaturas-laranja e analistas veem risco de novas fraudes em 2022
26/07/2021Os 56 anos do Código Eleitoral: é hora de mudar, mas também de agradecer
27/07/2021Especialistas afirmam que custo total se justifica pelas características do modelo brasileiro. Para Coordenador da ABRADEP, custo garante uma Justiça Eleitoral Independente
A Justiça Eleitoral custou ao país R$ 9,8 bilhões no último ano, e 64% desse montante foram destinados para pagar salários e encargos sociais. Em 2020, apesar de a pandemia da Covid ter afetado o funcionamento dos órgãos públicos, o que implicou redução de despesas administrativas, a Justiça Eleitoral precisou reforçar os gastos com a organização e realização das eleições municipais em razão da situação atípica.
As informações sobre os valores executados foram extraídas do Siga Brasil —ferramenta do Senado Federal de acompanhamento do Orçamento. A Folhapediu ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) na quarta-feira (21) números sobre a execução orçamentária, mas não houve resposta até a publicação desta reportagem.
Em anos não eleitorais, a tendência é de uma pequena queda nos gastos. A redução não é expressiva porque o custo com pessoal se mantém, assim como a estrutura, responsável pela análise de contas e julgamentos de processos eleitorais, entre outras funções.
A Justiça Eleitoral conta hoje com cerca de 15,5 mil servidores. Este segmento do Judiciário não tem magistrados de carreira. Nos estados, os juízes que atuam na área são oriundos das Justiças estadual e federal. Advogados completam o quadro. Em Brasília, o TSE é composto por ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e advogados.
Além de promover as eleições, com a instalação de urnas eletrônicas e convocação de mesários, para citar duas tarefas, a Justiça Eleitoral cuida do cadastro do eleitorado, do registro e da fiscalização dos partidos políticos, além de processar e julgar as questões eleitorais, que incluem as prestações de contas dos candidatos.
Essa peculiaridade do órgão —cuidar tanto do aspecto administrativo como judicial do processo eleitoral — o levou a ser chamado de “jabuticaba brasileira” por críticos. Isso também é uma das principais justificativas para os gastos do TSE, segundo Alexandre Bandeira, cientista político e diretor da Associação Brasileira de Consultores Políticos.
“Enquanto em outros países a função eleitoral é realizada por autarquias e agências, aqui temos uma Justiça Eleitoral híbrida, o que a torna cara, porque precisa julgar as questões eleitorais, elaborar normas e organizar referendos, plebiscitos e as eleições a cada dois anos”, explica.
Bandeira também diz acreditar que os altos salários do funcionalismo público e o modelo do Judiciário influenciam no peso do Orçamento. “Os órgãos do Judiciário contam com sedes faraônicas e têm uma necessidade de pessoal alta. As próprias características do sistema recursal brasileiro deixam a máquina pública inchada”, diz.
O advogado Renato Ribeiro de Almeida, por sua vez, vê no orçamento bilionário “um custo a se pagar por uma Justiça Eleitoral independente”. “Há exemplos de países em que o próprio governo organiza as eleições, apura os votos e julga os eventuais conflitos”, disse Almeida, doutor em direito pela Universidade de São Paulo e coordenador acadêmico da ABRADEP (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político). Ele citou de exemplo a Rússia, do presidente Vladimir Putin, no cargo desde 2012.
Em outros braços do Judiciário, caso da Justiça Federal, a folha de pagamentos e os encargos sociais respondem por mais de 85% do orçamento anual. Entre os críticos da Justiça Eleitoral, uma das ideias é deixar os processos judiciais na Justiça comum e criar um órgão que cuide exclusivamente das eleições.
Ex-vice-procurador-geral eleitoral, Eugênio Aragão vê as sugestões de mudança com cautela. Apesar de considerar os tribunais morosos na análise das prestações de contas eleitorais, ele afirma que é arriscado substituir o modelo atual por outro. “A Justiça Eleitoral foi criada na década de 30 para evitar fraudes nas eleições. A ideia foi bem justificada, porém temos hoje uma judicialização excessiva da política, um viés muito sancionatório. Talvez, seja o caso de pensarmos em criar um Conselho Eleitoral para cuidar do pleito. Mas é preciso cuidado, nossa tradição está dando certo, não podemos trocar o que temos por um sistema avacalhado”, pondera.
Aragão não vê problemas no orçamento do órgão e defende mudanças na legislação para permitir que os TREs (Tribunais Regionais Eleitorais) localizados nas 27 unidades da federação tenham mais juízes conforme a proporção da população. Atualmente, cada TRE tem sete juízes.
“De modo geral, considero a Justiça Eleitoral eficiente. Os problemas maiores são estruturais. O TRE de São Paulo tem muita morosidade porque tem a mesma quantidade de juízes que o Acre, por exemplo. Isso não faz sentido”, argumenta.
Segundo dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), em 2019, a Justiça Eleitoral recebeu 93,4 mil novos processos. No total, 129,3 mil casos foram julgados e outros 60,7 mil estão pendentes. Em média, uma ação demora um ano para ser julgada pelos TREs. No 1º grau, composto por um juiz eleitoral em cada zona eleitoral, o prazo diminuiu para dez meses. Ainda de acordo com o CNJ, a maioria dos casos estão relacionados à realização de eleições com questões que envolvem os candidatos, a prestação de contas e os cargos.