Condenação de Bolsonaro deve ser alerta a candidatos à reeleição
24/11/2023Especialistas da ABRADEP analisam condenações do TSE às fraudes de cotas de gênero, para O Globo
05/12/2023Se assumir a vaga aberta no STF (Supremo Tribunal Federal), o atual ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), pode enfrentar questionamentos para que seja considerado suspeito na hora de votar processos relacionados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Esse cenário é motivado por diferentes declarações públicas já feitas por Dino, que chegou a chamar Bolsonaro de “serial killer” e “próprio demônio”.
Segundo especialistas, porém, mesmo com a possibilidade de a parte interessada alegar suspeição, é pouco provável que Dino deixe de votar nos processos diante do histórico do STF.
Flávio Dino, um homem de cabelo curto grisalho, fala durante evento. Ele usa terno, camisa branca e gravata. Flávio Dino, um homem de cabelo curto grisalho, fala durante evento. Ele usa terno, camisa branca e gravata.
Flávio Dino durante coletiva de imprensa – Adriano Machado – 24.jul.23/Reuters
O presidente Lula (PT) anunciou na segunda-feira (27) a indicação de Dino para a vaga aberta no STF desde a aposentadoria de Rosa Weber, há dois meses.
Ele ainda passará por sabatina pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado no próximo dia 13 e por votação no colegiado e no plenário. A aprovação do nome só ocorre se for obtida maioria absoluta na votação da Casa, ou seja, ao menos 41 dos 81 senadores.
Durante a pandemia da Covid-19, o ex-governador do Maranhão pelo PC do B classificou a política adotada por Bolsonaro como “genocida” e disse que o então mandatário era “irresponsável”, “despreparado” e “desesperado”.
O ex-presidente acumula condenações judiciais desde que deixou o governo e ainda deve responder a inquéritos e a uma série de processos. Ele já foi incluído em procedimentos do STF que investigam supostos incitadores e autores intelectuais dos ataques golpistas de 8 de janeiro e outros relacionados à pandemia, por exemplo.
Ricardo Gueiros, professor de direito constitucional da Ufes (Universidade Federal do Espírito Santo), afirma que o Código de Processo Civil tem dois mecanismos para coibir a possível parcialidade dos juízes.
O artigo 144 cita os casos em que pode haver o impedimento do magistrado. Ele pode ser acionado quando o juiz, por exemplo, está prestes a votar em processos que envolvem companheiros ou parentes até o terceiro grau.
Já o artigo 145 prevê os casos de suspeição. É aventado quando há dúvidas se o juiz é amigo íntimo ou inimigo das partes do processo, por exemplo.
“As causas para o impedimento são mais fortes. Quando é o caso, dificilmente o juiz insiste em julgar o processo”, diz Gueiros. “Já a suspeição é mais subjetiva. Nesse caso, costumeiramente se vê o juiz tendente a julgar o processo, alegando que não é parcial.”
Há diferença entre impedimento e suspeição. Enquanto o impedimento tem regras mais objetivas, a suspeição dá margem à interpretação e nem sempre é reconhecida. Um aspecto comum é que os dois têm como finalidade garantir a imparcialidade nas decisões judiciais.
Segundo Gueiros, as falas de Dino sobre Bolsonaro poderiam ensejar suspeição. Ainda assim, seria pouco provável que a alegação fosse acolhida, tendo em vista o histórico do STF, que não costuma considerar o pedido procedente para os ministros da corte.
“O pedido de suspeição pela parte interessada muitas vezes não tem eficácia prática no STF. Depende mais de o próprio ministro se declarar suspeito. Se ele não o fizer, é pouco provável que a suspeição seja declarada pelo tribunal”, concorda Ana Beatriz Presgrave, professora de direito da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte).
Para os dois especialistas, entretanto, seria mais adequado se o próprio Dino se declarasse suspeito ao julgar fatos envolvendo Bolsonaro sobre os quais já se manifestou.
“O instituto da suspeição serve para que o magistrado adote as cautelas devidas para evitar a mera aparência da parcialidade, mesmo se considerando imparcial para julgar”, afirma Gueiros.
Ainda que Dino não se declare suspeito, a corte tem recursos para evitar que o resultado final dos julgamentos seja parcial, diz Presgrave.
“As decisões precisam ser fundamentadas juridicamente, e o STF é um órgão colegiado. Esses são mecanismos que podem evitar que o enviesamento político de um julgador contamine totalmente o julgado.”
Já Vânia Aieta, presidente da Comissão de Direito Constitucional da OAB-RJ e professora de direito da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), não considera que Dino precise necessariamente alegar suspeição nos processos envolvendo Bolsonaro.
“O Bolsonaro não é um desafeto ou inimigo do Dino. Eles foram opositores em campos políticos. Isso não quer dizer que Dino não tenha a serenidade para julgar o ex-presidente respeitando o devido processo legal”, afirma.
Para ela, entretanto, os mecanismos de impedimento e suspeição deveriam ser, de maneira geral, mais recorrentes, a fim de garantir a imparcialidade do Judiciário.
(…)