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22/01/2024Processo contra Moro expõe divergências em debate sobre gasto de pré-campanha
Caso tramita há quase um ano e julgamento do senador pode ocorrer neste mês na Justiça Eleitoral no Paraná
Os gastos feitos pelos partidos Podemos e União Brasil relacionados à pré-candidatura de Sergio Moro na disputa eleitoral de 2022 são o ponto central do processo que tramita contra o senador na Justiça Eleitoral, na esteira de um debate em torno da legislação sobre despesas na pré-campanha.
A ação de investigação judicial eleitoral contra Moro, eleito senador pela União, foi proposta no Paraná pelo PL e pela federação formada por PT, PV e PC do B. As legendas acusam Moro de abuso de poder econômico e utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social durante a pré-campanha.
Elas querem a declaração de sua inelegibilidade e a realização de nova eleição para a vaga no Senado do Paraná. Também apontam indícios de corrupção. Moro vem negando qualquer irregularidade.
O processo tramita há quase um ano, e a expectativa dos advogados das siglas é que o julgamento comece ainda neste mês.
A professora Patrícia Greco, integrante da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político), afirma que partidos e pré-candidatos devem ficar atentos ao período da pré-campanha, ainda que não exista obrigação legal de lançar os valores gastos nesse período na prestação de contas.
Os candidatos, diz ela, precisam de cautela e manter um controle, caso tenham se beneficiado desses valores. Em casos de volume de despesas muito elevados, isso pode ser levado em conta se houve extrapolação do teto de campanha.
“A partir do momento que a gente consegue individualizar os gastos, o correto seria, na fase de campanha, o candidato pegar todo aquele recurso individualizado, efetuado na fase de pré-campanha pelo partido, e colocar como repasse estimável em dinheiro na candidatura dele”, diz ela, se referindo a casos que tenham sido alvo de questionamentos, como o de Moro.
No processo do ex-juiz, PT e PL sustentam que, como ele estava na condição de pré-candidato a presidente da República pelo Podemos na maior parte do seu período de pré-campanha, as despesas dos partidos foram altas, o que gerou desequilíbrio na disputa —já que, no fim, ele concorreu contra candidatos ao Senado pelo Paraná, e não contra postulantes ao Planalto.
Segundo as siglas, uma nova soma faria com que Moro ultrapassasse o teto de gasto permitido em 2022 para a campanha ao Senado pelo Paraná, R$ 4.447.201,54. Na prestação de contas apresentada pela chapa de Moro à Justiça Eleitoral, o teto foi cumprido. A chapa informou ter gastado R$ 4.243.435,12 na campanha (excluindo pagamentos relativos a honorários advocatícios e contábeis, o que a legislação eleitoral permite).
Mas, segundo os partidos que atribuem abuso de poder econômico ao ex-juiz, a prestação de contas não considerou o gasto da pré-campanha, cujo valor também rende discussão.
No cálculo feito pelo Ministério Público Eleitoral, a pré-campanha de Moro, sustentada por recursos do Podemos e da União Brasil, custou, no mínimo, R$ 2.030.228,09.
Enquanto isso, a defesa de Moro fala em gastos módicos, calculados em R$ 141.034,70 na pré-campanha. O PL diz que foram ao menos R$ 7.600.702,14. Já o PT afirma que foram no mínimo R$ 4.790.051,25.
A diferença nos valores acontece porque cada um seguiu um critério diferente sobre o que pode ou não ser considerado gasto com pré-campanha e o que era efetivamente despesa ligada ao ex-juiz ou ao conjunto de pré-candidatos.
A defesa de Moro alega, por exemplo, que gasto com seguranças do ex-juiz, que exerceu a função de ministro da Justiça, não deveria estar na relação de despesas de pré-campanha.
“Se passar do teto, pode configurar abuso de poder econômico. Mas há outros fatores para serem analisados aí, como, por exemplo, quanto passou do teto. Às vezes passou pouco e não é o suficiente para gerar um desequilíbrio”, diz Greco.
“É o que a gente chama de aplicação do princípio da proporcionalidade. Se passar R$ 200 mil, isso é pouco para uma campanha de senador. Para um cargo de vereador de uma cidade pequena, é absurdo. Tem que analisar caso a caso para saber se de fato gerou desequilíbrio”, reforça a professora.
Há um debate sobre qual quantia seria razoável gastar em um período de pré-campanha, já que isso não estaria expresso na legislação. Segundo a advogada Juliana Bertholdi, que atua na área eleitoral, o “conceito de pré-campanha não nasceu na legislação, mas na jurisprudência”.
“A legislação eleitoral não define uma limitação de gastos no período de pré-campanha, mas julgamentos vêm historicamente condenando por abuso do poder econômico candidatos que investiram em suas pré-campanhas valores proporcionalmente maiores do que os limites legais da própria campanha”, diz ela.
Segundo Bertholdi, há um movimento em curso no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para determinar os limites por meio de resolução.
Dentro do processo do senador, o PT chama a atenção para um parecer feito pelo advogado Luis Felipe Cunha, que é também o primeiro suplente de Moro, sobre a questão do limite da pré-campanha.
Ao responder a uma consulta da União Brasil em abril de 2022, Cunha afirmou que o gasto no período não pode ser um valor significativo em relação ao teto de gasto de campanha para o cargo e sugeriu até 30% do limite como um parâmetro.
“Quanto ao valor entendido como parâmetro de razoabilidade, a legislação não possui critério e nem mesmo a jurisprudência chegou a firmar algum precedente neste sentido, reportando, unicamente, sobre as necessidades dos gastos alcançáveis ao pré-candidato médio para aquele cargo”, observou Cunha, em trecho do documento.
Ao levar o parecer do suplente para o caso, o advogado do PT, Luiz Eduardo Peccinin, acrescentou que já há um indicativo da jurisprudência eleitoral para se considerar um patamar de 10% do teto como razoável a um candidato médio na pré-campanha.
Levando em consideração o valor da pré-campanha de Moro defendido pelo Ministério Público Eleitoral (R$ 2.030.228,09), a quantia representaria 45% do teto de gasto para aquela campanha (R$ 4.447.201,54).