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29/08/2022Quase 30% dos deputados estaduais e distritais que concorrem à reeleição como pardos se declaravam brancos em 2018
No intervalo entre as eleições de 2018 e deste ano, candidatos à reeleição nas Assembleias Legislativas nos estados mudaram de cor na autodeclaração racial. Parlamentares eleitos enquanto brancos há quatro anos passaram a se declarar como pretos ou pardos. O volume de casos levanta suspeitas de tentativas de obter benefícios de políticas afirmativas para pessoas negras, obrigatórias aos partidos.
Entre os 241 deputados estaduais e distritais que concorrem à reeleição e se identificaram como pardos no registro da Justiça Eleitoral, quase 30% tinham se declarado como brancos em 2018 – ou 68 parlamentares, segundo levantou o JOTA, até a manhã desta quinta-feira (25/8). Em pelo menos metade dos casos, também em outras eleições desde 2014 a alternativa de cor de pele escolhida foi a branca.
O levantamento inclui deputados de 26 estados e do Distrito Federal com dados disponibilizados. Foram identificados casos em 21 Unidades da Federação. Na prática, apenas com a reeleição desses candidatos, essas Assembleias podem ter alterações de composição racial sem que tenha havido, de fato, avanços na eleição de representantes negros.
O movimento de troca de raça no registro é observado também em outras disputas, que costumam receber maior visibilidade – o que pode pressionar adequações pelos próprios candidatos, como a reportagem observou nos últimos dias.
Na Câmara dos Deputados, entre os 101 candidatos à reeleição que se declararam pardos, 41 se diziam brancos nas últimas eleições, conforme os dados disponíveis na semana passada – nesta quinta, eram 36 na situação. Com isso, segundo os números, antes mesmo das eleições, a Casa já passa a ter mais negros do que há quatro anos.
A classificação racial – com as opções amarela, branca, indígena, parda ou preta – nos registros de candidatos segue o modelo de autodeclaração do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), conforme também acontece no Censo demográfico. O Instituto entende que as pessoas pretas e pardas são negras.
Em 2020, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu que os candidatos negros devem receber recursos proporcionais na distribuição das verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e do tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão.
O entendimento foi firmado após a corte ter sido provocada por consulta da deputada deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ). Porém, diferentemente do que ela também requeria, não foi estabelecida cota mínima de candidatos negros, como acontece com as candidaturas femininas – que deve ser de, no mínimo, 30% dos nomes lançados pelos partidos.
Portanto, desde a decisão, estas eleições são as primeiras de nível geral a ter a regra. Há quatro anos, os partidos não eram obrigados a observar o critério racial para repassar valores às campanhas.
A maioria dos ministros concordou que a interpretação era importante para fomentar a participação da população negra na política. O objetivo seria evitar que esses candidatos recebessem recursos desproporcionais dos partidos em relação aos brancos, conforme acontece historicamente, o que prejudica campanhas e as chances de eles se elegerem.
Neste ano, a Justiça Eleitoral registrou um recorde no número de candidatos negros, que, pela primeira vez, passaram a ser maioria. Na análise por cargos disputados, eles estão em maior número do que os brancos apenas entre aspirantes a deputados estaduais e distritais. Eles são 52% e 54%, respectivamente.
Apesar do entendimento do TSE sobre a questão, a nova política não foi firmada em lei. Logo, não há definição clara de critérios para a autodeclaração e para combater casos de afirmação da cor por conveniência. Não está prevista qualquer medida de fiscalização, como ocorre em concursos públicos e universidades, em que há reserva de vagas para pretos, pardos e indígenas.
“Como não há previsão legal, isso não seria motivo para indeferir uma campanha de antemão. Se houver repasses indevidos, as prestações de contas dos partidos poderiam ser negadas, o que é difícil se forem considerados os registros dos candidatos”, diz Diogo Gradim, membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político. Por isso, será necessário esperar por uma resposta da Justiça Eleitoral ao julgar casos nesse campo.
Eventuais responsáveis poderiam potencialmente ser punidos por falsidade ideológica eleitoral. O Código Eleitoral prevê ser crime omitir ou fazer declarações falsas em documentos para fins eleitorais. A pena prevista, quando os documentos são públicos, é de reclusão de até cinco anos e pagamento de multa.
“Outra possibilidade também remota seria a caracterização de abuso de poder econômico pelo partido, ao concentrar recursos em uma candidatura de forma que não deveria”, afirma Gradim.
“Privilegiar a autodeclaração não é um problema, mas em concursos públicos bancas são previstas para evitar tentativas de fraude. O partido fica em uma posição delicada, suscetível a erros, mas pode coibir casos gritantes, já que ele é o responsável pelo repasse de recursos”, aponta.
Há deputados estaduais que mudaram de cor concorrendo por partidos de todos os espectros, como Cidadania, Democracia Cristã, MDB, PCdoB, PDT, PL, Podemos, PMB, PP, PSB, PSD, PSDB, PT, PTB, PSC, PV, Republicanos, Solidariedade e União Brasil.
Além do entendimento firmado pelo TSE, nestas eleições vale também uma nova regra, introduzida em reforma eleitoral pelo Congresso no ano passado, para incentivar investimentos em candidaturas femininas de negros. Os votos para deputado federal dados a candidatos negros ou mulheres valerão em dobro no cálculo de divisão do fundo eleitoral.