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A distribuição de dentaduras, botijão de gás ou outras vantagens em troca de votos fazem parte do anedotário eleitoral do país, mas a prática, considerada crime, está longe de ter ficado no passado. Levantamento do GLOBO com base em dados da Polícia Federal mostra que, de janeiro até esta sexta-feira, já foram abertos cem inquéritos para apurar a conduta, numa média de um a cada dois dias.
Ao todo, a PF iniciou 1.061 investigações relacionadas a crimes eleitorais neste ano. Nem todas, contudo, têm relação direta com as disputas municipais de outubro. Entre as condutas que mais motivaram a instauração de inquéritos, por exemplo, está o chamado “Caixa 2” — 343 casos —, que ocorre quando o candidato utiliza recursos financeiros sem declarar à Justiça Eleitoral. As apurações, portanto, são relacionadas a campanhas anteriores.
Total de inquéritos instaurados (1 de janeiro a 23 de agosto): 1.061
Os principais tipos de crimes investigados:
Inscrição fraudulenta de eleitores: 377
“Caixa 2”: 343
Compra de votos: 100
Desvio de recursos: 92
Uso de documento falsificado: 83
No topo do ranking dos crimes eleitorais alvo de investigação, com 377 inquéritos, está a inscrição fraulenta de eleitores. São tentativas de enganar a Justiça Eleitoral quanto à condição de votar como, por exemplo, o caso de alguém que nunca visitou uma cidade e busca a inscrição para votar naquele município. O suposto eleitor pode ser punido com pena de até cinco anos de prisão caso seja pego.
Já a pena prevista para quem for pego pedindo ou recebendo qualquer vantagem em troca do voto, seja para si ou para outra pessoa, é de quatro anos de prisão e multa. A legislação eleitoral estabelece que a conduta representa crime mesmo em caso de a oferta não ter sido aceita.
A PF aponta que dez pessoas chegaram a ser levadas a delegacias neste ano por suspeita de compra de votos. Um desses casos ocorreu em junho, quando um funcionário de um fórum de Mangaratiba, na Costa Verde, foi preso após ter sido flagrado por uma promotora negociando a compra de voto para um pré-candidato a prefeito na cidade.
Na ocasião, a promotora relatou à PF que estava em seu gabinete quando ouviu o homem, pelo celular, discutindo a compra de voto com um interlocutor por R$ 100. O enquadramento no crime independe do valor, que pode nem mesmo ser em dinheiro.
— A compra de votos pode se dar por meio do fornecimento de cestas básicas, combustível, dinheiro e, até mesmo, por meio de adornos de pequeno valor tais como: chinelos, dentaduras, bonés — afirmou o chefe da Divisão de Repressão a Crimes Eleitorais da PF, Fabricio Martins Rocha.
Segundo ele, a corporação realiza capacitações do seu efetivo para atualizar sobre as técnicas de investigação mais eficientes para o combate deste tipo de crime. A PF prevê intensificar as ações para coibir a prática com a proximidade de votação, que é quando esse tipo de conduta costuma ser mais observada.
Inquéritos eleitorais abertos por estado:
Rio: 145
São Paulo: 88
Paraná: 77
Sergipe: 77
Rio Grande do Norte: 56
Em abril, por exemplo, a PF prendeu o motorista de um senador que carregava R$ 50 mi em um carro a três dias da eleição suplementar em Alto Alegre (RR), município de 21 mil habitantes a 84 quilômetros da capital Boa Vista. Um inquérito foi aberto para apurar se o parlamentar estava envolvido.
Em outro caso semelhante, a apreensão de um carro abandonado com mais de R$ 1 milhão no porta-malas esquentou a disputa eleitoral em São Luis, capital do Maranhão. O veículo pertence a um ex-funcionário da prefeitura e a polícia identificou que foi deixado no local por um homem ligado ao irmão do prefeito, Eduardo Braide (PSD), que tenta a reeleição. O atual mandatário nega qualquer vinculação com o episódio, ocorrido no início do mês.
A investigação está a cargo da Polícia Civil, que a princípio não trata o caso como suspeita de compra de votos. O rival de Braide na disputa municipal, o deputado Duarte Junior (PSB-MA), contudo, tem cobrado que a Polícia Federal entre no caso para apurar possível crime eleitoral.
O advogado e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep) Adriano Alves, defende uma revisão no código eleitoral para que a legislação penal envolvendo os pleitos se adeque às novas práticas de compra de votos.
— É preciso uma reforma para se adequar à realidade das redes sociais e da tecnologia. Contudo, parte dos crimes descritos na lei ainda garante o mínimo de lisura e integridade do pleito eleitoral, bem como a proteção da democracia — disse Adriano.