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26/08/2024Na mira da Justiça Eleitoral, comunidade passou a organizar competições remuneradas para viralizar vídeos de sócios do coach que fazem campanha para o candidato em São Paulo
Alçado ao segundo lugar na pesquisa Datafolha divulgada na última quinta-feira (22), o candidato à prefeitura de São Paulo Pablo Marçal (PRTB) mantém uma fábrica de conteúdos para a sua campanha nas redes sociais a partir da plataforma Discord, muito usada por adeptos de jogos online.
Intitulada “Cortes do Marçal”, a comunidade funciona como um grande grupo de troca de mensagens e conteúdos variados, com 148 mil membros que disputam um concurso de vídeos e outros materiais em troca de prêmios em dinheiro que podem chegar a R$ 22 mil reais.
Até a campanha começar, o esquema de pagamento para multiplicação de vídeos visava promover engajamento principalmente para vídeos que reproduzem trechos de entrevistas, lives, palestras e falas de Marçal em debates.
Agora na mira da Justiça Eleitoral, que avalia se esse pagamento configura abuso de poder econômico – suficiente para cassar uma candidatura –, o canal tem direcionado as competições de vídeos pagos para os sócios do coach. Alguns dos vencedores, porém, são vídeos com os sócios fazendo campanha para o próprio Marçal.
Ao longo de dois dias, quinta (22) e sexta-feira (23), a equipe da coluna monitorou o canal de Marçal no Discord e contabilizou 230 recortes em prol do candidato compartilhados.
Nos diálogos, pessoas de várias partes do país e brasileiros que afirmaram morar em Portugal se oferecem para fazer campanha dia e noite, produzindo vídeos virais em troca de dinheiro. Mas nas respostas, os administradores dizem que deram uma pausa no pagamento dos vídeos de Marçal em cumprimento a lei eleitoral.
Ainda assim, todo o treinamento é feito com vídeos sobre Marçal, utilizando dezenas de tutoriais e recortes – vários deles com a logomarca oficial da campanha, incluindo o nome de Marçal, sua vice, Antônia de Jesus (PRTB), e seu número na urna.
Entre 31 de julho e 18 de agosto, foi feita uma competição paga por recortes que seriam para a rede social de um sócio de Marçal, o empresário Marcos Paulo, que se apresenta como empresário de marketing digital nas redes.
Nessas competições, todos os usuários postam seus vídeos ao longo de um prazo determinado que, no último caso, foi de 19 dias. Após o término da disputa, a relação de vencedores é publicada na comunidade, ao lado dos prêmios correspondentes. Mas, depois disso, os resultados são apagados.
No concurso de recortes do aliado de Marçal, que tem 1 milhão de seguidores, o prêmio para os três melhores colocados foi de 22 mil reais cada – o principal critério é o engajamento das publicações. Quem ficou entre a quarta e a décima posição ganhou R$ 2 mil. Os outros dez ganharam entre R$ 500 e R$ 800, a depender do ranking.
Havia ainda uma segunda categoria de premiados que ganharam pela quantidade de vídeos publicados. Nesse caso, os prêmios foram de R$ 100 e R$ 1,5 mil. Outro prêmio possível pagava para quem tivesse mais visualizações num único dia – aí as remunerações eram menores, de R$ 50 a R$ 200.
Nesta categoria, um dos vídeos vencedores trazia Marcos Paulo prevendo que Marçal venceria a disputa pela prefeitura de São Paulo já no primeiro turno.
Na próxima competição, prevista para a segunda-feira (26), o personagem deve ser Renato Cariani, outro sócio de Marçal. Cariani é réu na Justiça por tráfico de drogas e suspeito de desviar insumos farmacêuticos para a produção de entorpecentes por facções criminosas. Ele e o coach promoveram um curso de autoajuda, encerrado em julho.
Para Maíra Recchia, advogada especialista em direito eleitoral e integrante da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), todas essas postagens indicam que o Discord de Marçal descumpre a lei eleitoral.
“Não se pode pagar ou premiar para ter engajamento nas redes que levam o nome do candidato sob pena de haver ilícito eleitoral”, afirma Maíra.
“Inclusive pode-se analisar se a premiação de maneira cruzada para seus sócios induzem o eleitorado a engajar referidos perfis que são serão verdadeiros cabos eleitorais do candidato e estão diretamente ligados à campanha. Condutas assim podem configurar abuso de poder econômico e ter consequência para todos os envolvidos”.
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