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29/06/2022Aborto é capital político?
29/06/2022A criação de um novo benefício para caminhoneiros, bem como o pagamento de valores maiores do Auxílio Brasil e do vale-gás para famílias pobres, embute o risco de responsabilização do presidente Jair Bolsonaro (PL) no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com base na lei eleitoral vigente. No limite, a depender de como essas benesses sejam distribuídas e anunciadas, abre-se uma brecha para que seja condenado por abuso de poder político e econômico na campanha, condutas que podem levar à cassação de seu registro de candidatura e, em caso de reeleição, à perda do novo mandato.
É o que dizem advogados especializados em direito eleitoral e constitucional consultados pela Gazeta do Povo a respeito da PEC 16, proposta de emenda à Constituição em discussão no Senado e de interesse do governo. A PEC busca atenuar o impacto do aumento do preço dos combustíveis, não apenas sobre o setor de transporte, mas também no bolso da população pobre, mais prejudicada pela inflação, que também cresce com a alta do diesel, por exemplo.
Inicialmente, o plano do governo federal era pressionar os estados a reduzir o ICMS sobre o diesel, o gás de cozinha e o etanol, oferecendo a eles, como contrapartida, um repasse de R$ 26,9 bilhões até o fim do ano. Diante de resistência de grande parte dos governadores, e de um efeito incerto na redução do preço final para o consumidor, senadores governistas mudaram a PEC.
O novo texto, em elaboração, cria um benefício de mil reais, que seria pagos todo mês, até dezembro, para 900 mil caminhoneiros autônomos, a um custo total de R$ 5,4 bilhões. Além disso, a PEC aumentaria o Auxílio Brasil, que passaria de R$ 400 para R$ 600 até o final do ano, gerando despesa de R$ 21,6 bilhões. O vale-gás passaria de R$ 50 para R$ 120, pagos a cada dois meses para famílias pobres, ao custo de R$ 1,5 bilhão.
Da redação inicial, seria mantida apenas a compensação aos estados pela redução a 12% das alíquotas de ICMS para o etanol, com custo de R$ 3,8 bilhões para os cofres federais. Por fim, os estados ainda levariam R$ 2,5 bilhões para compensar a gratuidade dos idosos no transporte público. Tudo isso só valeria até o final deste ano e custaria, no total, R$ 34,8 bilhões, que seriam liberados pelo governo fora do teto de gastos.
Uma das principais preocupações, no entanto, é com os limites da lei eleitoral (nº 9.504/97), que proíbe a União em seu artigo 73 de transferir recursos para estados e municípios de forma voluntária nos três meses que antecedem as eleições, bem como a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios em ano eleitoral.
A própria lei eleitoral, no entanto, traz exceções. Os repasses federais para entes subnacionais podem ser feitos para cumprir “obrigação formal preexistente” ou “atender situações de emergência e de calamidade pública”. Da mesma forma, a distribuição de benesses diretamente para a população – ou segmentos dela – pode ocorrer em casos de calamidade pública, estado de emergência ou dentro de programas sociais que já eram executados no ano anterior.
Para a advogada Isabel Mota, coordenadora da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), há risco para o presidente Bolsonaro mesmo em relação ao aumento de benefícios já existentes. Poderia haver tolerância em relação a reajustes que impliquem apenas em atualização monetária, para correção de valores pela inflação. O que for além disso poderia representar um abuso, especialmente se for usado para desequilibrar a disputa eleitoral.
“O Auxílio Brasil não foi criado recentemente, foi uma transformação de um programa que já existia há muito tempo, o Bolsa Família. E quando houve alteração do nome, já se previa que poderia ser um valor maior. Então, pode ser indicado que a atualização desse benefício para manter poder de compra era necessário. Agora, nesse valor, talvez exorbite dessa atualização monetária, em que pese a gente estar num quadro de inflação bem galopante no país”, diz.