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11/04/2022O PL 2630, que trata do combate à desinformação em plataformas virtuais, começará a ser votado na Câmara nesta quarta-feira, pelo plenário da Casa. O texto, que já passou pelo Senado, tem sofrido alterações recentes, com a ação de grupos de trabalho voltados ao tema. Na semana passada, o deputado Orlando Silva (PCdoB/SP), relator da proposta, apresentou um novo texto, que ainda é alvo de críticas.
Na versão mais recente, um dos pontos que mais chamou a atenção foi um aceno do relator do texto à própria classe política: o deputado passou a sugerir que, a partir de agora, a imunidade parlamentar material estende-se às plataformas mantidas pelos provedores de aplicação de redes sociais. Com isso, o direito à liberdade de expressão dos parlamentares não poderia ser contido por regras mais rígidas de contenção à desinformação.
Em uma entrevista coletiva sobre o tema, Orlando ressaltou que o texto, no entanto, não protege nem crimes, nem criminosos. Para tanto, o deputado citou o caso do seu companheiro de parlamento Daniel Silveira, que é réu no STF (Supremo Tribunal Federal), acusado de ameaçar ministros da suprema corte em redes sociais.
“O poder Judiciário vai decidir o caso de Daniel Silveira em função de crimes cometidos e tipificados na legislação que versa sobre o Estado Democrático de Direito – à época a Lei de Segurança Nacional”, resumiu Orlando. “A imunidade parlamentar material não servirá para proteger nem crime nem criminoso”.
A proposta entraria em choque com uma ação cada vez mais consolidada de autoridades policiais e judiciais em combater as fake news no Brasil. Nos últimos anos, parlamentares como o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) já tiveram publicações restritas e mesmo retiradas do ar em redes sociais.
Em fevereiro, o Twitter bloqueou o acesso do parlamentar –supostamente por engano– e em março uma juíza obrigou que a empresa removesse um post considerado sexista do parlamentar. Em ambos os casos, a imunidade parlamentar poderia ter agido.
Caso mais limítrofe aconteceu com o deputado federal pelo Paraná Fernando Francischini, que teve seu mandato cassado por propagar mentiras a respeito das urnas eletrônicas no dia da eleição de 2018. O parlamentar, que não chegou a se reeleger para o atual mandato, agora está inelegível por oito anos, no primeiro caso de afastamento do cargo por disparo de notícias falsas. A imunidade parlamentar nas redes sociais poderia dar outro fim ao tema.
O texto fala exclusivamente em uma exceção aos parlamentares – o que retiraria o presidente da República da isenção. Hoje, Jair Bolsonaro é um dos mais habilidosos articuladores políticos nas redes sociais, se valendo de um alto uso de fake news.
O presidente é investigado pela Polícia Federal por conta de uma live onde associou, sem nenhuma prova, a vacina da Covid-19 ao aumento nos casos de contaminação pelo vírus HIV. Contra ele, a lei poderia continuar agindo.
A proposta é apontada como um retrocesso pelo professor e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP), Elder Goltzman. “O Supremo Tribunal Federal separar as expressões feitas fora e dentro do Congresso”, explica. “Via de regra, as expressões feitas dentro do Congresso têm imunidade absoluta e as fora, relativa. Relativa porque para serem imunes precisam estar relacionadas com as funções parlamentares.”
Para Elder, o dispositivo colocado gera dúvidas sobre sua constitucionalidade. Em uma análise retrospectiva, o advogado entende que, se esse dispositivo existisse, os avanços no combate às fake news teriam sido menores, “não só pela dificuldade que as autoridades públicas encontrariam, mas também pela moderação de conteúdo feita pelas próprias plataformas”. Manifestações que já foram neutralizadas teriam sido bloqueadas pela nova lei, de acordo com Elder.
“É mais um retrocesso do que um avanço”, adiciona Samara Castro, advogada do Observatório de Eleições da OAB-RJ e membro da ABRADEP. “A imunidade parlamentar é um requisito essencial para qualquer democracia. Só com parlamentares livres, podendo opinar e se expressar de forma livre e protegida, que temos uma democracia consolidada.”
No entanto, a liberdade parlamentar precisa ser limitada nas liberdades dos outros. “É um texto que inclusive compromete todo o PL 2630”, diz Samara, que enxerga danos estruturais a todo o esforço da proposta. “A forma como ele está esta extensão da imunidade nas redes sociais, desconsidera os limites que existem no mundo off-line. Precisaria se remodelar o texto para que dele saísse algo positivo.”