Lei das fake news deve ter efeito inócuo nas eleições
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21/03/2022No último sábado (19/03), operadoras de telefonia celular já estavam informando os seus clientes sobre a sentença proferida pelo ministro Alexandre de Moraes a pedido da Polícia Federal (PF). No fim da tarde de domingo, Moraes revogou a decisão e liberou Telegram em todo o Brasil, após o cumprimento, pela plataforma, de determinações feitas pelo magistrado.
Em conversa com a Sputnik Brasil, juristas se dividem sobre a procedência da medida. A argumentação acatada por Moraes se baseia em tentativas frustradas de contato por parte da PF com o aplicativo.
“O Telegram é notoriamente conhecido por sua postura de não cooperar com autoridades judiciais e policiais de diversos países, inclusive colocando essa atitude não colaborativa como uma vantagem em relação a outros aplicativos de comunicação”, declarou a polícia.
Na noite de 18/03, Durov publicou uma mensagem em seu canal do Telegram pedindo desculpas ao STF e mais alguns dias para que cumprisse todas as determinações das autoridades brasileiras. “Poderemos processar com eficiência as solicitações de remoção de canais públicos ilegais no Brasil”, disse o empresário.
Bloqueio do Telegram é aceitável?
Para a advogada Samara Castro, especialista em direito digital e membro da ABRADEP, a decisão de estrangular o acesso ao aplicativo é inócua. “Existem dois aspectos com relação à questão do Telegram. Primeiro é o aspecto jurídico no sentido de que essa é uma decisão que ultrapassa os limites daquilo que o STF teria competência para fazer dentro de um processo como esse. Especialmente quando a gente pensa em uma lógica de que é um processo administrativo que tem consequências bastante pesadas. O segundo aspecto é o da eficácia de uma medida como essa porque qual o fim que se busca com o bloqueio do Telegram? O combate à desinformação. Mas o Telegram não é o único canal onde a desinformação está colocada”, criticou ela.
Castro prossegue dizendo que mesmo a falta de representação no Brasil e a ausência de respostas da plataforma às autoridades não justificam a medida. “Em que pese a gente colocar vários argumentos, como a não-representação no Brasil, a falta de respostas da plataforma, o que se busca ao fim é o combate à desinformação. Mas o combate à desinformação não se dá em uma única plataforma, não se dá com um bloqueio, e não se dá com argumentos que, na verdade, desconstituiriam parte da Internet. Porque se a gente for olhar os aplicativos, hoje, praticamente mais de 90% não têm representação no Brasil. O que deveria nos preocupar é sobre como a gente vai lidar com essa desinformação desenfreada em todas as plataformas. E quais são as medidas que vamos exigir delas”, argumentou.
Ela lembrou, também, da falta de compromisso de empresas de tecnologia que mantêm sede no Brasil, mas que relutam para tirar conteúdo mentiroso das suas plataformas, e disse que é exagerado aplicar multa em quem usar o serviço de VPN (rede privada virtual, na sigla em inglês, que criptografa e disfarça a identidade dos usuários na Internet).
“Mesmo aquelas que têm representação no Brasil, como Meta, Google e outras, não estão com um compromisso totalmente firmado e transparente de cumprimento de decisões judiciais. Nem mesmo de combate à desinformação e todas as medidas exigidas de transparência, de governança. Inclusive nem trabalhamos com a base mínima de exigências que são colocadas na Europa, por exemplo. O problema é muito mais abaixo do que o bloqueio de uma ou outra plataforma. Além disso, a medida de multa de R$ 100 mil para quem usar VPN para acessar o aplicativo é desproporcional”, finalizou a advogada.