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21/06/2021Artigo publicado no Estado de S. Paulo nesta sexta-feira, 18/06, que contou com a participação de Demétrio Justo, membro da ABRADEP, discute as expectativas sobre a reforma política, encarada como a redentora de todo o sistema político brasileiro. Os autores destacam que há, na opinião pública, uma ideia que a simples alteração das regras pode mudar a conduta dos agentes políticos e transformá-los em republicanos.
Há pouco mais de uma década o cientista político Fabiano Santos, ex-presidente da Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP), utilizava o termo “correlação espúria” para designar a forma como o tema da reforma política está inserido no debate público brasileiro. A expressão, muito conhecida dos estatísticos, denotaria, sobretudo, a maneira pela qual a mudança nas regras que regulam a escolha de nossos representantes é observada por grande parte da opinião pública, imprensa e a classe política em geral. A ideia disseminada é de que a simples alteração no regramento eleitoral seria capaz de produzir uma mudança na conduta dos agentes políticos. Como se num passe de mágica, ao alterarmos esse conjunto de regras, criássemos verdadeiros “anjos” republicanos.
E por falar em República, o assunto faz parte da agenda política do País pelo menos desde a Revolução de 1930, liderada por Vargas, que trazia a temática da reforma política sob o binômio “representação e justiça”. No ano de 1932, portanto, antes do período ditatorial do Estado Novo, Vargas implementou parcialmente o sistema eleitoral proporcional, criou a Justiça Eleitoral, o Código Eleitoral, juntamente com as primeiras regulamentações sobre os partidos, liberou o voto feminino, além de diminuir a idade mínima para 18 anos, ainda que o voto ao analfabeto continuasse proibido.
A partir da redemocratização e a fundação da Nova República, com mais intensidade após a eleição presidencial de 1989 e o plebiscito sobre formas e sistemas de governo realizado em abril de 1993, o tema da reforma política se tornou frequente no noticiário político nacional. Ou seja, pouco tempo após a promulgação da Constituição Federal de 1988 o debate da reforma política já estava na pauta do Congresso Nacional. Como dito anteriormente, quase sempre de maneira equivocada, a percepção é de que a tal reforma seria a solução para todos os males da vida republicana brasileira. Tornou-se um jargão conhecido, denominá-la, equivocadamente, como a “mãe de todas as reformas”. Naquele momento, o presidencialismo e a fragmentação partidária eram observados como os grandes empecilhos à construção da estabilidade política.
No atual contexto, se o conjunto de propostas de reformas eleitorais se encontra descolado de seu objetivo primordial, que pode ser compreendido como o aprimoramento dos mecanismos de representação, há outro ponto de grande relevância e sobre o qual pouco nos atentamos: a falsa ideia de que não realizamos reformas. Ao contrário do que se imagina, a elite política brasileira há mais de duas décadas tem alterado, constantemente, as regras que regem o funcionamento de nosso arranjo institucional. A partir da lei 8.713/1993, que autorizava as doações empresariais em campanhas eleitorais, inúmeras alterações significativas foram realizadas modificando o regramento eleitoral no intervalo entre uma eleição e outra.
Em 2015, durante a presidência de Eduardo Cunha (PMDB) na Câmara dos Deputados, além da questão do fim das doações empresariais de campanha, à época, em pauta no STF, a tentativa de Cunha em aprovar o sistema eleitoral denominado “distritão”, conhecido na literatura especializada como Voto Único Não Transferível (SNTV), mobilizou a comunidade de cientistas políticos brasileiros numa campanha liderada pela ABCP que, na ocasião, foi fundamental para a derrota da proposta no plenário. Dois anos depois, o mesmo distritão retornou à pauta no Parlamento brasileiro, sendo derrotado novamente com a oposição maciça dos estudiosos em novo manifesto publicado pela ABCP. Importante mencionar que esse modelo de sistema eleitoral é o mesmo vigente no Afeganistão.