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11/08/2025As big techs são pessoas jurídicas que atuam em território nacional, com representação formal estabelecida conforme decisão do Supremo Tribunal Federal. Como qualquer outro setor econômico, essas empresas carregam seus próprios interesses. A reunião delas em uma associação está plenamente amparada pelo direito fundamental à livre associação, garantido pela Constituição Federal.
O limite para essa atuação é a lei. Como bem resume o conhecido adágio liberal: “o direito de um termina onde começa o do outro”. Além disso, o ordenamento jurídico brasileiro dispõe de um conjunto normativo que regulamenta as associações, a começar pelo Código Civil. Grupos de interesse sempre existiram, e continuarão a existir. Imaginar que pessoas e organizações não buscarão defender seus interesses, inclusive junto ao Poder Público, especialmente no Congresso Nacional, é uma visão ingênua. O que se exige é transparência e respeito aos princípios republicanos. Justamente por isso, seria mais produtivo regulamentar o lobby no Brasil, em vez de alimentar o cenário de informalidade e suspeição que o cerca. Há, ainda, uma certa cultura de encenação política, que tende a obscurecer os reais debates em torno do tema.
No que se refere à atuação coordenada das big techs no debate sobre o PL das fake news, é natural que interesses econômicos privados entrem em tensão com o interesse público. Esse tipo de conflito é inerente ao processo legislativo. No Parlamento, há quem defenda uma regulamentação mais rígida, enquanto outros preferem uma abordagem mais liberal. As plataformas, por sua vez, também possuem interesses legítimos. Esse embate faz parte da dinâmica democrática.
Cabe ao Poder Executivo zelar pela soberania nacional. No entanto, não lhe compete regular diretamente plataformas digitais nem assumir o papel de censor das redes sociais. Investidas nesse sentido são motivo de preocupação, pois a concentração de poder carrega o risco constante de abusos. A atuação das empresas na defesa de seus interesses deve ser compreendida dentro da legalidade e da legitimidade democrática.
O debate em torno do PL das fake news existe justamente para permitir que diferentes pontos de vista sejam expostos. Em um Estado Democrático de Direito, é inaceitável qualquer tentativa de restringir o debate público ou a atuação legítima de atores sociais e econômicos. Em algumas manifestações recentes, a atuação da Advocacia-Geral da União tem despertado questionamentos, ao assumir posturas que remetem mais à lógica policialesca do que à defesa técnica e imparcial do Estado.
A formação de associações empresariais não compromete o debate democrático. Ao contrário: pode até qualificá-lo. O que merece atenção é a regulação em si, um tema cuja competência legislativa é privativa da União e que deve ser tratada com o devido respeito ao pacto federativo. Ainda assim, outros entes federativos podem e devem atuar no fomento à economia digital, sem invadir competências constitucionais.
Na Europa, há uma série de propostas em curso sobre regulação digital. Algumas delas podem servir de referência, inclusive como exemplo do que deve ser evitado.
Por fim, o direito de associação é uma garantia constitucional. O debate público sobre a regulação das plataformas não será comprometido por sua existência. Ao contrário: a participação organizada de diferentes setores pode contribuir para a construção de soluções mais equilibradas e democráticas. As plataformas também devem ser ouvidas.