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19/12/2025No dia 30 de julho de 2025, o Ato nº 209 da Mesa da Câmara dos Deputados colocou fim a uma longa discussão travada nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 7.228, 7.263 e 7.325.
O cerne da discussão tratava basicamente da terceira rodada de distribuição de vagas parlamentares — as chamadas “sobras das sobras”. O legislador, ao alterar o Código Eleitoral (artigo 109, § 2º), ergueu uma cláusula de barreira, exigindo que, para disputar esses assentos residuais, o partido deveria alcançar 80% do quociente eleitoral e o candidato, individualmente, 20%.
Além disso, o artigo 111 instituía uma espécie de “distritão” residual, entregando vagas aos mais votados caso nenhum partido atingisse o quociente.
Julgamento no STF
No julgamento de mérito, o plenário do STF acolheu a tese da inconstitucionalidade parcial, conferindo interpretação conforme à Constituição para permitir a ampla participação das legendas na terceira rodada, além de declarar a inconstitucionalidade do modelo majoritário do artigo 111.
Entretanto, o acórdão trouxe um problema quanto à modulação dos efeitos. Por uma maioria de seis votos, a Corte decidiu aplicar as novas regras apenas a partir do pleito de 2024. Em sede de embargos de declaração, o STF atribuiu efeitos infringentes à decisão, reconhecendo que, não atingido o quórum qualificado do artigo 27 da Lei nº 9.868/99, deveria ser aplicada a nulidade com efeito ex tunc.
Com a aplicação retroativa às eleições de 2022, o recálculo das sobras resultou no mencionado Ato da Mesa da Câmara, que declarou a perda de mandato de sete deputados federais: Silvia Waiãpi e Sonize Barbosa (ambas do PL-AP), Professora Goreth (PDT-AP), Augusto Puppio (MDB-AP), Lázaro Botelho (PP-TO), Gilvan Máximo (Republicanos-DF) e Lebrão (União Brasil-RO).
Em contrapartida, para ocupar essas vagas, foram diplomados e convocados os seguintes parlamentares: do Amapá, Professora Marcivânia (PCdoB), Paulo Lemos (PSOL), André Abdon (PP) e Aline Gurgel (Republicanos); no Tocantins, assumiu Tiago Dimas (Podemos); no Distrito Federal, a vaga foi ocupada por Rodrigo Rollemberg (PSB); e em Rondônia, tomou posse Rafael Fera (Podemos).
Lei dos Partidos Políticos
O Brasil tem experimentado idas e vindas em relação ao tema, destacando-se o julgamento conjunto das ADIs 1351 e 1354, em 2006, que declarou inconstitucional a cláusula de desempenho prevista na redação original do artigo 13, da Lei dos Partidos Políticos e a criação de uma nova cláusula pela Emenda Constitucional nº 97, de 2017.
Ora se impõe a defesa do pluralismo e do sistema proporcional, ora o pragmatismo se coloca no combate à fragmentação partidária. O fato é que, talvez a pouca prática jurídica com os números oculte verdades inconvenientes que não passam despercebidas a um escrutínio empírico quantitativo.
O Código Eleitoral de 1965 adota o sistema D’Hondt na distribuição das sobras eleitorais em relação aos assentos proporcionais. Segundo este sistema, após a definição do quociente eleitoral, as cadeiras restantes são distribuídas dividindo-se o número total de votos de cada partido sucessivamente por divisores inteiros (n + 1), onde n é o número de cadeiras que o partido já obteve mais a próxima em disputa.
A cada rodada, a vaga é atribuída ao partido que apresentar a maior média resultante desse cálculo, repetindo-se o processo até que todas as cadeiras disponíveis sejam preenchidas.
Redução de quocientes partidários
O favorecimento às grandes legendas no sistema D’Hondt decorre intrinsecamente de sua lógica aritmética de divisores sequenciais, que impõe uma redução mais gradual aos quocientes partidários em comparação a outros métodos de médias maiores. Ou seja, grandes partidos conseguem amortecer o impacto do aumento do divisor.
Ao dividir o total de votos por números inteiros consecutivos, o modelo permite que partidos com votações robustas mantenham médias competitivas por mais tempo durante a distribuição das sobras, capturando cadeiras adicionais — a segunda ou terceira vaga de um grande partido frequentemente supera a média inicial de um partido menor —, gerando, assim, uma tendência matemática à concentração de cadeiras e à sobrerrepresentação das maiorias.
A regra 80-20 intensifica esse fenômeno ao excluir da disputa pelas sobras (na segunda rodada) as legendas que não atingiram 80% do quociente eleitoral, mesmo que estas tivessem uma média aritmética superior à de um grande partido disputando sua 5ª ou 6ª vaga.
A remoção da regra 80-20 a partir da terceira rodada aparentemente favorece os pequenos partidos e os dados empíricos confirmam a previsão. Porém, o impacto em prol das grandes agremiações já está dado nas rodadas iniciais.
A título de exemplo, nas eleições de 2022, uma cadeira do PL custou aproximadamente 183 mil votos, enquanto uma cadeira do PSB, 298 mil.
Naquelas eleições, a aplicação da regra 80-20 em todas as rodadas fez com que os três maiores partidos da Câmara (PL, PT e União) concentrassem aproximadamente 44% das vagas, apesar de terem obtido cerca de 38% dos votos válidos.
A decisão do STF realocou pouco mais de 1,3% dos assentos, dos quais apenas cinco (aproximadamente 1%) foram efetivamente entregues a partidos menores (PC do B, PSOL, PSB, Podemos).
Enquanto o debate jurídico oscila entre a proteção do pluralismo e a governabilidade, a arquitetura matemática do sistema continua a operar silenciosamente nos bastidores, numa lenta e contínua asfixia dos pequenos.
Se a proporcionalidade sonhada por Assis Brasil sobreviverá, só o tempo dirá.




