
Decisão do STF em Embu-Guaçu destaca limites constitucionais ao exercício de mandatos eletivos
08/09/2025
ABRADEP sorteará, entre integrantes, 10 bolsas para curso de Inteligência Artificial
09/09/2025Por Amanda Cunha
Tramita no Senado o projeto do novo Código Eleitoral (PL 112/2021). A votação final na casa tem sido marcada (e atrasada) pelas polêmicas ao redor da adoção do voto impresso, das políticas afirmativas de gênero e do tempo de “quarentena” para servidores públicos concorrerem.
No meio das discussões, e das críticas sobre outros pontos não tão amadurecidos no novo Código de mais de 900 artigos, segue uma revolução silenciosa, absolutamente necessária e transformadora: a adoção de regras de Direito sancionador no Direito Eleitoral.
Das principais críticas que se fazem atualmente sobre a normativa eleitoral, e que causam muita repercussão tanto na seara jurídica, quanto política e social, está justamente o fato de haver muito poder na mão da autoridade eleitoral para impor sanções graves de cassação e inelegibilidade por condutas que, na prática, acabam por ser definidas de forma ampla e subjetiva nos casos concretos. Isso porque não há, até então, delimitação prévia legislativa para o que seja o abuso de poder, a corrupção e a fraude para fins eleitorais, elementos ensejadores de muitas punições.
Coube aos teóricos e à jurisprudência construírem seus elementos, o que mantém um status de muita insegurança jurídica no direito eleitoral sancionador, além de um ônus argumentativo extenuante para os aplicadores da norma.
Nesse aspecto, a proposta acerta em trazer, desde a parte principiológica, delimitações que buscam conferir maior racionalidade e razoabilidade às lides eleitorais.
Já no artigo 2º […] X, há a adoção da regra do “in dubio pro suffragium”, uma regra de hermenêutica que impõe o dever de a autoridade decidir, quando houver dúvida acerca dos elementos do processo, principalmente das provas e da autoria, em favor do voto popular. É a adaptação da regra tradicionalmente conferida no direito penal “in dubio pro reu“, a qual determina que, na dúvida, deve decidir-se a favor do réu.
Logo adiante, no artigo 6º §2º, outra regra interpretativa a corroborar esse entendimento, colocando a fundamentalidade dos direitos políticos de todo acusado na balança sancionatória:
“Em casos de dúvida, as normas eleitorais deverão ser interpretadas de maneira a maximizar a soberania popular, o exercício dos direitos políticos, a liberdade de expressão e a promoção da igualdade de gênero e raça”
No artigo 5º, há a previsão da possibilidade de retroatividade benéfica das leis eleitorais sancionatórias, seja sobre a regra em si, seja sobre o prazo da imposição das sanções.
Essas poucas regras, por si sós, irradiam por todo o ordenamento eleitoral, a partir das quais surge a obrigação para o intérprete e aplicador da norma de adotá-las como ponto de partida hermenêutico. O novo Código, portanto, desde já, coloca as regras de direito sancionador como elemento central da nova compreensão do novo sistema normativo.
Tipificações
Além disso, de forma inédita, avança decisivamente na definição das condutas de abuso de poder econômico [1], político [2], fraude [3] e corrupção [4], antes, conforme apontado de início, sem qualquer tipificação.
Surge, assim, e também, ao aplicador da norma o dever de observar e preencher, para fins de imposição de sanção, os elementos constantes do tipo, bem como de fazer a subsunção do fato concreto imputado ao acusado à norma. É definitivamente um ponto de virada que conferirá maior previsibilidade, equilíbrio e segurança jurídica no direito eleitoral sancionador.
Define também quais são os critérios quantitativos e qualitativos, antes também avaliados na prática dos casos contenciosos, a serem observados na configuração do ilícito e também para avaliar a gravidade para imposição da sanção de cassação de candidatos [5].
E para além de todos esses contornos, dispõe que as hipóteses de abuso de poder passam a ser taxativas nos moldes previstos e devem ser interpretadas de modo restritivo [6], ou seja, limita justamente a subjetividade com que se acabava ampliando a aplicação da norma sancionadora para casos não previamente previstos.
Equilíbrio
Esse panorama, sem dúvida alguma, muda profundamente toda a racionalidade do Direito Eleitoral sancionador e confere mais estabilidade não só aos processos contenciosos eleitorais, como à própria atuação da Justiça Eleitoral, às eleições e a todo processo democrático.
Em tempos de crises institucionais e sociais, sem dúvida um equilíbrio salutar da balança do poder punitivo estatal na seara eleitoral.
Todavia, para que estas novas normas entrem em vigor a tempo das eleições de 2026, o novo Código precisa ser aprovado nas duas Casas do Congresso e sancionado pelo presidente da República até outubro deste ano, justamente um ano antes do próximo pleito, em obediência ao comando constitucional da anualidade eleitoral.
Referências:
[1] Art. 585. Constitui abuso de poder econômico a utilização desmedida de aporte patrimonial que acarrete vantagem eleitoral indevida, punível com multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a R$ 200.000,00 (duzentos mil reais).
[2] Art. 586. Constitui abuso de poder político a exploração eleitoreira da estrutura do Estado, bem como o uso desvirtuado das competências e prerrogativas inerentes à condição de agente público que acarrete vantagem eleitoral indevida, punível com multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a R$ 200.000,00 (duzentos mil reais).
[3] Art. 588 § 1º Considera-se fraude todo expediente ardiloso empregado com o objetivo de burlar regra ou direito assegurado pela legislação eleitoral.
[4] Art. 588 § 2º Considera-se corrupção toda prática antijurídica empreendida com o objetivo de controlar, mediante o oferecimento de compensação material ou imaterial, o comportamento de eleitores, candidatos adversários e autoridades ou servidores da Justiça Eleitoral.
[5] Art. 589-592
[6] Art. 583 […] § 3º As hipóteses de abuso de poder previstas nesta Lei são taxativas, devendo ser interpretadas de modo restritivo.