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A Lei nº 14.230/2021 alterou o regime da improbidade administrativa e introduziu, entre outras mudanças, nova disciplina sobre o prazo prescricional (artigo 23 da Lei nº 8.429/1992).
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Tema 1.199 (ARE 843.989/PR), estabeleceu limites à retroatividade da reforma, admitindo sua aplicação apenas aos atos culposos não transitados em julgado e afastando sua aplicabilidade para atos dolosos e para o regime prescricional em relação a fatos anteriores à entrada em vigor da lei. Dessa forma, estabeleceu-se como marco temporal para o novo regime prescricional a data da publicação da lei.
No entanto, a medida cautelar deferida monocraticamente na ADI 7.236/DF suspendeu a eficácia do §5º do artigo 23 — dispositivo que reduz pela metade o prazo prescricional subsequente a certas causas interruptivas — e acabou por gerar uma tensão normativa que clamava por resolução colegiada.
Redução do prazo prescricional
A alteração normativa previu que, após determinadas causas interruptivas, o prazo prescricional subsequente correria pela metade. A justificativa do legislador foi baseada na intenção de equilibrar celeridade e efetividade.
O que se tinha era causas sem marcos definidos que acabavam por promover prorrogação incerta do período instrutório, dessa forma, o texto inserido na lei de improbidade inseriu um limite temporal razoável para a atuação estatal. Ou seja, a norma visou conciliar segurança jurídica com o dever de tutelar o erário.
Em decisão monocrática, o relator do processo concedeu medida cautelar que suspendeu a aplicação do §5º do artigo 23. O fundamento central foi o risco de prescrição massiva em ações já em curso, caso a redução temporal começasse a operar de imediato. A cautelar está disponível no portal do STF (aqui).
Impõe relembrar que o julgamento do ARE 843.989/PR que fixou Tese 1.199 ocorreu em ocorreu em 18 de agosto de 2022, oportunidade em que o colegiado analisando o regime prescricional da alteração normativa, entendeu por fixar o marco a data da publicação da lei.
Insegurança jurídica
A suspensão monocrática revela incoerência e produz insegurança. Primeiro, porque interfere na escolha normativa do legislador — opção legítima do Congresso — antes de decisão colegiada definitiva. Segundo, porque colide com o entendimento do Plenário no Tema 1.199, que delimitou a retroatividade da reforma, indicando que o regime prescricional não retroage para fatos dolosos anteriores, além de regular o marco da prescrição.
A medida cautelar, ao impedir a aplicação do §5º, deixou no limbo os processos cuja disciplina temporal deveria, em teoria, seguir a nova lei para fatos posteriores à sua entrada em vigor.
A contradição é patente: o Plenário já analisou o marco temporal e fixou que a lei não retroage para o regime prescricional, o que não impede que o legislador regule prospectivamente prazos distintos. Ao suspender o §5º, o relator interrompeu uma norma de conteúdo prospectivo, sob o fundamento de risco de prescrição massiva, risco esse já previsto quando da fixação do tema 1199 pelo plenário da Corte.
Efeitos práticos da suspensão do §5º
A suspensão enseja consequências concretas: a multiplicação de incidentes processuais sobre qual marco aplicar; estratégias defensivas de espera que retardam a produção de provas; pressão sobre órgãos de controle para priorização de processos; aumento de recursos e incidentes, sobrecarregando o Judiciário; risco real de perda de objeto em processos que dependem de diligências complexas; dificuldade para operadores identificarem se a redução do prazo deve ser considerada para fatos subsequentes.
Importa esclarecer quais atos interruptivos produzem efeitos capazes de renovar a contagem do prazo: tradicionalmente, a propositura da ação; publicação da sentença condenatória; publicação de decisão ou acórdão dos tribunais que confirma sentença condenatória ou que reforma sentença de improcedência. A prescrição intercorrente, por sua vez, decorre da inércia processual durante o andamento do feito.
O Tema 1.199 fixou que a reforma não altera retroativamente o regime prescricional para fatos dolosos anteriores; assim, ações com recebimento de denúncia (ou equivalente) anterior à vigência da Lei mantém o regime anterior. Para fatos ocorridos depois da vigência, contudo, a suspensão monocrática gerou insegurança sobre a aplicação do §5º e, consequentemente, sobre o tempo que passa a contar após cada interrupção.
Em síntese: fatos anteriores seguem o regime antigo; fatos posteriores ficam sujeitos à incerteza gerada pela cautelar, sobretudo no que tange à redução pela metade do prazo.
Assim cabe aos atantes e aplicadores de direito mapear processos com risco de prescrição e priorizá‑los; impulsionar atos interruptivos robustos que possam, incontestavelmente, interromper a prescrição; documentar diligências e comunicar ao juízo todas as iniciativas instrutórias; pleitear tutela provisória para resguardar o interesse público quando houver risco de perda do objeto; invocar o Tema 1.199 em peças quando houver discussão de retroatividade para processos com fatos anteriores à vigência, bem como monitorar o julgamento da ADI 7.236/DF e decisões do STJ que venham a interpretar a cautelar.
Conclusão
A suspensão monocrática do §5º do artigo 23, embora motivada pela legítima preocupação de evitar prescrição em massa, criou uma situação paradoxal: sustentou temporariamente uma intervenção sobre norma legítima do legislador e fermentou instabilidade quanto ao marco temporal aplicável em casos futuros. A via adequada seria a resolução célere e colegiada do tema pelo Plenário do STF, com definição clara dos efeitos temporais da reforma. Até lá, cabe aos operadores do direito adotar postura diligente e técnica para preservar direitos e o interesse público.]
Referências
BRASIL. Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992. Disponível aqui.
BRASIL. Lei nº 14.230, de 26 de outubro de 2021. Disponível aqui.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ARE 843.989/PR (Tema 1.199). Disponível no portal do STF: aqui.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADI 7236/DF — medida cautelar (PDF). Disponível aqui.




